Superação,
força de vontade e amor pela vaquejada. Essas são características que marcam a
vida de Maria Angélica Bida Veloso, 20 anos. Natural da cidade de Altos,
a 37 km de Teresina, a jovem começou a disputar vaquejadas aos 15 anos, depois
de recusar um carro como presente de aniversário do pai e optar por um cavalo.
Começava ali a trajetória de vitórias, tanto nas pistas como na vida da
adolescente.
A
jovem vaqueira começou a virar atração de forma meteórica nos parques de
vaquejada, conquistou prêmios em competições importantes do Piauí e virou rainha da vaqueirama na cidade
de Altos. Mas a carreira seria interrompida dois anos depois, quando a jovem
foi diagnosticada com um angioma cerebral e precisou fazer uma delicada
cirurgia na cabeça.
Após
o processo cirúrgico, Angélica teve graves complicações, ficou oito dias em
coma e nesse período ainda sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) que a
deixou sem movimentos no lado esquerdo do corpo. Ainda em decorrência das
complicações da cirurgia, a vaqueira teve osteomielite, uma infecção no osso
craniano que resultou na retirada de toda a massa óssea do lado direito da sua
cabeça.
Apesar
da gravidade do problema, a adolescente encontrou forças na família e no amor
pelo mundo das vaquejadas para superar o drama. Segundo ela, nunca passou pela
cabeça desistir de sua grande paixão. "Sempre me mantive confiante. Voltei
a montar apenas três meses depois da cirurgia, ainda com o curativo na
cabeça", disse.
A
paixão por cavalo e por vaquejada é tão grande que a vaqueira piauiense
confessa até mesmo ignorar o receio dos médicos em certos momentos. "Minha
lesão foi muito grande, mas confesso que não me baseio muito por eles não
[risos]. A principal recomendação é montar com capacete para proteger a
cabeça", falou.
Quando
saiu do hospital, Maria Angélica não conseguia andar e voltou para casa usando
uma cadeira de rodas. Para recepcionar a filha vaqueira, a família colocou um
grande outdoor na cidade de Altos. O outdoor tinha uma grande foto dela montada
em um cavalo e trazia os dizeres: 'Maria Angélica. Você é nossa campeã. Nós te
amamos'.
Mesmo
com o corpo bastante fragilizado e sem boa parte dos movimentos, ela conta que
não teve medo de voltar a montar no seu cavalo, apelidado carinhosamente de
Pitchula. "Eu não conseguia montar e por isso precisaram me colocar no
animal. Depois que estava montada queriam segurar o cabresto, mas eu não
deixei. Não tive medo e queria andar sozinha", relembrou.
O
pai de Angélica, Francisco Veloso, conta que a paixão por cavalo contribuiu
bastante na recuperação da filha. "Hoje nós reconhecemos que chegamos a
fazer loucura por ela, pois a levamos para ver o cavalo ainda com a cabeça
aberta", disse. Segundo ele, o estado físico da filha logo após o retorno
do hospital era lastimável, mas o desejo de voltar a competir e conviver com os
animais fez Angélica superar as dificuldades.
"Ela tem um amor muito grande pelo cavalo. Acho que ela
gosta mais do cavalo do que do pai", disse aos risos.
A
mãe da adolescente, Argentina Bida Veloso, conta que uma das primeiras coisas
que Angélica perguntou quando acordou do coma foi pelo cavalo. Ela afirma que
temia vê-la montar após os graves problemas que enfrentou, mas relata que
aquilo fazia bem à filha. "Eu temia, mas apoiei porque apoio meus filhos
em qualquer situação", disse.
Três
anos após o grave problema de saúde, Angélica treina nos fins de semana para
voltar a disputar competições oficiais em 2016. Durante a semana, a jovem faz
faculdade de direito em Teresina e passa por sessões diárias de fisioterapia.
Ela já caminha sem dificuldades, mas ainda não movimenta plenamente o lado
esquerdo do corpo. Mesmo assim, garante que está quase pronta para derrubar o
boi na faixa nas vaquejadas.
"No
próximo ano espero voltar, pois é o tempo que também termino a faculdade. Já
consigo correr e derrubar o boi, mas ainda não estou totalmente pronta para
disputar competições agora", disse a jovem. Devido a limitação de
movimentos, Angélica não encaixa o pé esquerdo no estribo e usa uma cinta
improvisada pelos pais para se fixar no cavalo.
Um
dos desejos da vaqueira é competir nas vaquejadas de Juazeiro do Norte, no
Ceará. Enquanto isso, na cidade de Altos a jovem é rainha dos vaqueiros em
várias festividades. Como forma de agradecimento pela recuperação, todos os
anos a família realiza uma grande cavalgada com a vaqueirama da região. O ponto
de partida é a casa dos pais de Angélica.
Para a mãe da adolescente, a família é abençoada e só tem a
agradecer. "Hoje nos consideramos uma família reabilitada de tudo que
aconteceu. A Maria Angélica é uma pessoa muito amada por todos e sempre é
convidada para os festejos da região. Acredito que ela hoje virou um mito nas
vaquejadas", concluiu dona Argentina Bida.
Angélica nunca gostou de "bater esteira" [função do
vaqueiro que passa a cauda do animal para o colega]. Ela mesma é quem bota o
boi abaixo. Enquanto aguarda para voltar a ouvir o tradicional 'valeu o boi'
nas festas de vaquejada, a jovem vaqueira piauiense já pode, sem dúvida, ouvir
o grito de 'valeu Maria Angélica'.
Fonte: G1.